Apesar
de toda a sua
criatividade formal e da sua
inclinação rebelde
com relação a poesia que era feita antes da década de 20 do século
passado, a produção
poética de Manuel Bandeira (1886 – 1968) poderia ser resumida em
uma única palavra: melancolia. O
recifense enfrentou diversos problemas familiares que naturalmente
foram espelhados em sua obra poética, além da doença que o
acompanhou até o
seu
falecimento:
a tuberculose. A morte prematura dos pais, da irmã e
do irmão o marcaram pelo
resto da vida e foram tema de algumas de suas poesias. E
Bandeira, que aos 18 anos
foi impedido de seguir os
estudos para que se tornasse um arquiteto,
por causa da doença dos
pulmões, a qual
naquela época não disponha de cura,
não se afastou do instinto criativo e seguiu pelo caminho da poesia.
Ela foi uma porta que se
abriu para que pudesse se refugiar das tribulações que
o destino o impunha,
consolando-o ainda no início
da sua vida adulta.
Portanto,
na maioria das vezes, a
poesia em Bandeira é triste,
porém, bela. Ela recebe um potente combustível cuja
fonte são as várias
intempéries que acometem a vida
do poeta recifense.
Metamorfoseando-se em versos
simples, confessionais e intimistas. Cada
verso pretende fazer doer o leitor, oferecendo-lhe
a dor do poeta. Ela vem em
doses de contra-gotas
e nos
impõe sutilmente a
sua realidade, expondo-nos a tristeza discreta
ou indiscreta,
sentimento corrente na vida
de todo ser humano. É
interessante também
ressaltar que
as alegrias da sua vida
foram esporádicas,
pontuais, apesar de todos os
amigos que conquistou, dos fãs que dispunha, dos eventos culturais
que participou e de outros bons episódios que marcaram a sua longa
existência. Tudo era
transitório e acessório,
com exceção da dor da melancolia, a
sua velha e constante amiga.
Nesse sentido,
testemunhava-a
poeticamente em seus livros,
nos saraus poéticos, nos
festivais e em tudo em que marcava presença, levantando
com genialidade a bandeira do seu sentimento maior.
Seguem
abaixo alguns versos que explicitam com
sucesso a postura
melancólica de
Manuel Bandeira:
Título: Madrigal Melancólico
O que eu adoro em ti,
Não é a tua beleza.
A beleza, é em nós que ela existe.
A beleza é um conceito.
E a beleza é triste.
Não é triste em si,
Mas que pela que há nela de fragilidade e de incerteza.
(….........)
Título:
Desencanto
Eu faço versos como quem chora,
De desalento... de desencanto...
Fecha
o meu livro se por agora
Não
tens motivo nenhum de pranto.
Meu
verso é sangue. Volúpia ardente...
Tristeza
esparsa... remorso vão...
Dói-me
nas veias. Amargo e quente,
Cai,
gota a gota, do coração.
(….........)
Considerando
que a melancolia é uma constante em Bandeira, a mesma foi
construída ao
longo de várias décadas com
maestria, delicadeza, maturidade e sabedoria. Contudo,
ele não foi dominado pela tristeza mas, pelo contrário, dominou-a,
colocou-a rédeas e a utilizou em benefício da arte poética, assim
como aconteceu com a
relevante poeta americana
Emily Dickinson (1830 – 1886) e
também, em
vários momentos das suas
respectivas obras,
com os célebres poetas
latino-americanos:
o chileno Pablo Neruda (1904 – 1973) e o brasileiro Vinicius
de Morais (1913 – 1980),
ambos exploraram com
contudencia
e beleza este
tema. A
melancolia é, portanto, desnuda, saboreada
e apresentada ao leitor em centenas
de versos
e o que, no final das contas, foi
enxergado por muitos estudiosos
da sua obra como
um instrumento estigmatizante
é também o que engrandece a poesia feita na
maioria das
vezes por Manuel Bandeira, o
nobre e
eterno senhor das terras de
Pasárgada.